Busquem, pois, em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas serão acrescentadas a vocês. (Mc 6.33).
Por
onde forem, preguem esta mensagem: O Reino dos céus está próximo. (Mt
10.7).
Introdução
As expressões “Reino dos Céus” e “Reino
de Deus” aparecem com frequência nos Evangelhos, sendo centrais na pregação
de Jesus. Embora muitos intérpretes as tratem como sinônimas, a investigação
exegética e teológica aponta para nuances que ajudam a compreender a riqueza
desse conceito. O presente estudo busca apresentar a origem, definição e
implicações bíblico-teológicas dessas expressões, considerando a tradição da
Igreja e o impacto pastoral para a vida cristã.
1. Origem e contexto bíblico
O Evangelho
de Mateus utiliza quase exclusivamente o termo “Reino dos Céus” (cerca de 32 vezes),
enquanto Marcos, Lucas e João preferem “Reino
de Deus”. A diferença pode ser explicada pelo contexto judaico: os judeus do primeiro século, por reverência,
evitavam pronunciar o nome divino, utilizando circunlóquios como “céus” em
lugar de “Deus”¹. Assim, Mateus, escrevendo principalmente para judeus, adapta
sua linguagem sem alterar o conteúdo.
2. Unidade conceitual das
expressões
Apesar da distinção terminológica, não há diferença essencial entre
“Reino dos Céus” e “Reino de Deus”. Ambas remetem ao governo soberano de Deus e à manifestação de
Seu domínio na história. Como observa George Eldon Ladd, o Reino é ao mesmo
tempo presente e futuro,
um “já e ainda não”². Jesus inaugura o Reino em Seu ministério terreno (Mt
12.28), mas sua plenitude só será revelada na consumação escatológica (Mt
25.34).
3. Sentido teológico do Reino
O conceito de Reino é dinâmico e multifacetado:
- Presente: já está entre nós,
manifestando-se na obra redentora de Cristo (Lc 11.20).
- Interior: não se reduz a um
território, mas é realidade espiritual: “o Reino de Deus está dentro de
vós” (Lc 17.21).
- Escatológico: alcançará plenitude na nova
criação (Ap 21.1-4).
Agostinho de Hipona identificou o Reino tanto com a
Igreja peregrina no tempo quanto
com a Jerusalém Celestial,
realidade consumada em Deus³. Já Joachim Jeremias enfatizou o caráter
escatológico, sublinhando que o anúncio de Jesus não se refere apenas a um
futuro distante, mas à presença atual do Reino na vida dos fiéis⁴.
4. Implicações pastorais
A compreensão do Reino de Deus não é apenas
acadêmica, mas prática e devocional. Os discípulos de Cristo são chamados a buscar primeiro o Reino (Mt 6.33), o
que significa colocar a vontade de Deus acima dos interesses pessoais. O Reino
não é conquistado por mérito humano, mas recebido como dom gratuito (Mc 10.15). Assim, viver sob o Reino é submeter-se ao
senhorio de Cristo e refletir Seu caráter no mundo.
Assim, como já mencionado quando lemos “Reino dos
Céus” em Mateus e “Reino de Deus” nos outros evangelhos, não devemos imaginar
dois reinos diferentes. Trata-se do mesmo Reino: o senhorio de Deus manifestado em Jesus Cristo.
- O
Reino já está presente porque Jesus trouxe a graça, o perdão e a vida
nova.
- Mas
o Reino ainda será plenamente revelado quando Cristo voltar e restaurar
todas as coisas.
- Hoje,
somos chamados a viver como cidadãos desse Reino, buscando antes de tudo a
vontade de Deus e confiando em Sua justiça.
Em outras palavras: o Reino não é apenas “um lugar
para onde iremos”, mas uma realidade
que já começou dentro de nós e se manifesta quando vivemos em obediência
e amor ao Rei, Jesus.
5. O Reino de Deus e o Reino dos
Céus na Teologia Pentecostal
No contexto pentecostal, tal tema recebe contornos
próprios, marcados pela ênfase no batismo
no Espírito Santo, nos dons
carismáticos e na esperança
escatológica. Este estudo busca analisar como os teólogos pentecostais
compreendem a relação entre “Reino dos Céus” e “Reino de Deus”, suas dimensões
presentes e futuras, bem como as implicações eclesiológicas e missionárias
desta doutrina.
Na perspectiva pentecostal, o Reino de Deus já se manifesta no aqui e agora por meio da presença do Espírito Santo. A
descida do Espírito no dia de Pentecostes (At 2.1-4) é compreendida como o
início da era do Reino inaugurado por Cristo5
·
Myer Pearlman ensina que o Reino é “a esfera em que
a vontade de Deus é reconhecida e obedecida”, sendo a Igreja a sua expressão
visível6.
·
Stanley Horton
destaca que os dons espirituais, as curas e as manifestações de poder são
“sinais concretos de que o Reino chegou”7.
Assim, os
pentecostais associam o Reino não apenas a uma realidade espiritual interna,
mas também à experiência carismática que
confirma a ação viva de Deus entre os fiéis.
Embora o Reino esteja presente, sua plenitude é
entendida como futura e escatológica.
Os pentecostais esperam a volta iminente de Cristo, evento que consumará o
Reino de forma visível e universal (1 Ts 4.16-17).
Antônio Gilberto, um dos principais sistematizadores
pentecostais no Brasil, afirma que “o Reino de Deus é o governo de Deus nos
corações hoje, manifestado pelo Espírito, e plenamente revelado na vinda
gloriosa de Cristo”8.
Essa ênfase escatológica alimenta a espiritualidade pentecostal marcada pela expectativa constante da parousia e pela urgência evangelizadora.
Outro aspecto relevante na teologia pentecostal é
a compreensão do Reino em chave ética e missionária. Viver no Reino significa:
·
Praticar a santidade pessoal (Hb 12.14).
·
Ser testemunha de Cristo no poder do Espírito
(At 1.8).
·
Participar ativamente da missão de Deus,
proclamando o Evangelho em palavras e ações.
Desse modo, o Reino
não é apenas uma esperança futura, mas uma realidade que transforma a vida do
crente e o envia em missão.
Conclusão
“Reino dos Céus” e “Reino de Deus” são expressões
equivalentes, usadas em contextos distintos, mas que apontam para a mesma
realidade: o governo soberano de Deus
inaugurado em Cristo e consumado na eternidade. A teologia cristã, desde os
Pais da Igreja até a pesquisa contemporânea, reconhece que o Reino é presente, interior e escatológico,
e a Igreja é chamada a viver essa realidade com esperança, fidelidade e
compromisso missionário.
____________________________________________________________________
- Ver D. A. Carson, Matthew
(Grand Rapids: Zondervan, 1984), p. 102.
- George Eldon Ladd, The
Gospel of the Kingdom (Grand Rapids: Eerdmans, 1959), p. 19.
- Agostinho, A Cidade de
Deus, Livro XIX.
- Joachim Jeremias, New Testament Theology (New York: Scribner, 1971), p. 98.
- Stanley M. Horton, O que a Bíblia diz sobre o Espírito Santo (Rio de Janeiro: CPAD, 1996), p. 127..
- Myer Pearlman, Conhecendo as Doutrinas da Bíblia (Rio de Janeiro: CPAD, 2004), p. 237.
7. Stanley M. Horton, Teologia
Sistemática: Uma Perspectiva Pentecostal (Rio de Janeiro: CPAD, 1996), p.
421.
8. Antônio Gilberto, Manual
da Escola Dominical (Rio de Janeiro: CPAD, 1980), p. 215.
Gloria Deus!
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