Por Josué de A Soares
Introdução
O termo “Trindade” (em latim, Trinitas) é uma das expressões
mais centrais e, ao mesmo tempo, mais complexas da teologia cristã. Apesar de a
doutrina trinitária estar presente nas Escrituras de forma implícita, o uso técnico do termo “Trindade” surgiu
apenas nos primeiros séculos da era cristã, como forma de sistematizar a fé em um único Deus
revelado em três Pessoas: Pai, Filho e Espírito Santo.
1. A origem do termo “Trindade”
A palavra Trinitas foi empregada pela primeira vez por Tertuliano de Cartago
(c. 160–220 d.C.), um dos pais da Igreja de língua latina, em sua obra Adversus
Praxean (“Contra Práxeas”). Ele utilizou o termo para explicar a distinção e unidade entre as três
pessoas divinas, combatendo o monarquianismo
modalista, que afirmava que o Pai, o Filho e o Espírito eram apenas
modos diferentes de manifestação de um único Deus sem distinção pessoal¹.
Tertuliano escreveu: “Trinitas unius
divinitatis, Pater et Filius et Spiritus Sanctus” (“A Trindade de uma única
divindade: Pai, Filho e Espírito Santo”)². Essa formulação foi um marco teológico,
pois estabeleceu a base conceitual para o desenvolvimento posterior da
doutrina.
2. Desenvolvimento e aceitação no
pensamento cristão
Após Tertuliano, outros teólogos contribuíram para
a consolidação da terminologia trinitária. Orígenes de Alexandria (c. 185–254) empregou o termo Trinitas
no contexto grego (Triás), enfatizando que o Filho é eternamente gerado
pelo Pai e que o Espírito procede de ambos³.
O Concílio
de Niceia (325 d.C.) foi o ponto decisivo para a aceitação oficial da
doutrina. Nesse concílio, a Igreja afirmou a consubstancialidade (homoousios) do Filho com o Pai, em
resposta ao arianismo, que
negava a plena divindade do Filho⁴. A expressão “Trindade”, embora não
mencionada explicitamente no Credo Niceno, passou a ser aceita como categoria teológica que sintetizava a
fé ortodoxa.
Mais tarde, o Concílio de Constantinopla (381 d.C.) completou a definição ao
incluir a plena divindade do Espírito Santo, consagrando definitivamente a
fórmula trinitária na teologia e liturgia cristã⁵.
3. A sistematização patrística
Com o passar dos séculos, teólogos como Atanásio de Alexandria, Basílio de Cesareia, Gregório de Nazianzo e Agostinho de Hipona refinaram o
conceito. Agostinho, em sua obra De Trinitate, desenvolveu uma
compreensão filosófico-teológica da unidade e diversidade divina, afirmando que
“Deus é uma essência e três pessoas”⁶.
Esses esforços consolidaram a doutrina não apenas
como uma verdade de fé, mas também como estrutura
fundamental do pensamento cristão. Assim, o termo “Trindade” deixou de
ser uma expressão polêmica e passou a representar a ortodoxia cristã
universalmente reconhecida.
Conclusão
O nome “Trindade” nasceu da necessidade de a
Igreja primitiva expressar, de modo coerente e fiel à revelação bíblica, o
mistério de um Deus único em três pessoas. Desde Tertuliano até os grandes
concílios ecumênicos, o termo foi sendo aperfeiçoado e aceito como símbolo da unidade e diversidade divinas.
A aceitação do nome e da doutrina da Trindade não se deu por especulação
filosófica, mas por fidelidade à
experiência da fé cristã, que reconhece a ação conjunta do Pai, do Filho
e do Espírito Santo na criação, redenção e santificação da humanidade.
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- TERTULIANO. Adversus
Praxean, cap. II. In: SCHNEIDER, Theodor (org.). Tratado de
Teologia Dogmática: Deus Uno e Trino. São Paulo: Paulus, 1999.
- GONZÁLEZ, Justo L. História
do Pensamento Cristão. Vol. 1. São Paulo: Vida Nova, 2004, p. 162.
- ORÍGENES. De Principiis,
I, 3, 5. Trad. Henry Chadwick. Cambridge: Cambridge University Press,
1966.
- BETTENSON, Henry. Documentos
da Igreja Cristã. São Paulo: ASTE, 2001, p. 56–58.
- KELLY, J. N. D. Doutrinas
Centrais da Fé Cristã. São Paulo: Vida Nova, 1994, p. 129–132.
- AGOSTINHO. De Trinitate.
In: Obras Completas de Santo Agostinho. Madrid: BAC, 1955, p. 37–45.
Bom artigo!
ResponderExcluirEsclarecedor!
ResponderExcluirFelicidades!
ResponderExcluirQue venha outros artigos. Deus abençoe!
ResponderExcluirBenção de Deus!
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